segunda-feira, maio 28, 2007
Estamos a ser observados
Em 1948, George Orwell escreveu o célebre romance 1984, no qual o Estado omnipresente obrigava toda a gente — sob a atenta observação do Big Brother — a cumprir escrupulosamente as leis. Nessa altura, não se imaginava que, 60 anos depois, o seu prenúncio se tornaria realidade em empresas privadas, que armazenam todos os dados que nós, voluntariamente, ministramos aos motores de busca da Internet, a partir dos quais é possível saber as nossas preferências, os nossos gostos, as nossas transacções e as nossas comunicações pessoais.Mas a diferença entre a visão orwelliana de 1984 e o controlo à distância a que hoje estamos submetidos quando usamos os nossos computadores é significativa. O Big Brother de Orwell era o olho que observava e controlava, a partir do célebre quarto 101, os elementos indesejáveis ao Estado totalitário. Hoje, os dados que detêm os motores de busca, como o Google, fomos nós que voluntariamente os fornecemos. Somos controlados porque quisemos.
Foram muitos os media que, na semana que passou, se debruçaram sobre esta verdadeira praga. O Financial Times escreveu na primeira página que “Google se propõe organizar a nossa vida diária”. O diário suíço Le Temps articula: “Google quer saber tudo sobre os internautas”. Le Figaro salienta que “Google se interessa de perto ao nosso ADN”. Até a revista de direita, muito próxima do UMP de Sarkozy, Le Point, faz eco da preocupação da “Europa que se inquieta com a conservação dos dados pelo Google”. É tal a quantidade de dados que esta e outras empresas da Internet detêm sobre os seus utilizadores que não vem longe o dia em que nos começarão a indicar que tipo de trabalho podemos obter ou qual é a cor das calças que nos fica melhor. Trata-se de personalizar toda a informação susceptível de nos interessar.
O mais alto responsável do Google, Eric Schmidt, justifica esta acumulação de dados de todos os utilizadores como um serviço personalizado que pode ser de grande utilidade para cada um dos indivíduos ligados à rede. No entanto, como o poder está na informação, tudo isso faz parte de uma batalha que se trava à escala global para ver quem possui mais dados, mais comportamentos e mais interesses pessoais dos internautas.
A minha privacidade pode assim ser partilhada por milhões de cidadãos do mundo inteiro. Não há dúvidas que se trata de um grande avanço, mas também é um perigo que pode tornar pública toda a minha intimidade, os meus gostos pessoais e tudo o que possa pertencer ao reservado território da minha pessoa. Pergunto a mim mesmo: que se passaria no dia em que uma ditadura nacionalizasse esses motores de busca? Nem quero pensar.
Etiquetas: Direitos Humanos, Tecnologia
:: enviado por JAM :: 5/28/2007 09:30:00 da manhã :: início ::
2 comentário(s):
-
Para lá caminhamos...De Lovely Toys, em maio 28, 2007 11:24 da manhã
-
Muito provavelmente, a realidade é bastante mais grave do que o receio que a imaginação permite.De , em maio 28, 2007 6:05 da tarde
Algumas pontas do iceberg não devem permitir o tamanho do cujo, bem escondido para evitar a revolta.
Depois do 25 de Abril, fiquei admirado quando descobri que do meu processo na PIDE até constava o pedido do BI.
Agora, não tenho dúvidas que, sem a minha autorização, há hoje entidades que sabem mais a meu respeito do que a PIDE sabia.