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sexta-feira, outubro 19, 2007

"Porreiro, pá!"

Há frases que ficam na história. Todos nos lembramos do “um pequeno passo para o homem, um grande salto para a humanidade", só para dar um exemplo.
A partir de ontem teremos que acrescentar o “Porreiro, pá!”.
Segundo José Sócrates e Zé Manel, estamos a viver um momento histórico para a Europa e quiçá para Portugal. As perspectivas que se abrem são extraordinárias: a Europa vai afirmar-se no Mundo e os problemas dos europeus poderão enfim ser resolvidos.
Ao ouvi-los, tentei sentir-me como aqueles que assistiram na praia do Restelo à partida de Vasco da Gama para a Índia ou como os que estavam no estádio Wankdorf de Berna a assistir à primeira vitória do Benfica na Taça dos Campeões.
Tentei (juro que tentei) sentir-me embriagado pelo momento histórico que estou a viver. Tentei sentir aquele misto de euforia e vertigem por ver a História realizar-se diante dos meus olhos. Não consegui. Suponho que só os poucos eleitos que moldam a História se aperceberão da importância do instante. Sócrates e Zé Manel conseguem-no. Eu não.
Pelos vistos não sou o único. Passando uma vista de olhos pela imprensa internacional, constatei com horror que ninguém se apercebeu do momento histórico que estamos a viver. Para a imprensa internacional, o divórcio de Sarkozy ou o atentado no Paquistão são mais importantes que a “nova Europa”. É pena.
Não faço a mínima ideia se este momento ainda será recordado daqui a 50 anos. Se o for, os netos e os bisnetos dos portugueses terão uma enorme vantagem nos exames europeus quando lhes perguntarem qual a frase que marcou a cimeira.

History never looks like history when you are living through it. — John W. Gardner

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:: enviado por U18 Team :: 10/19/2007 06:48:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

quinta-feira, julho 26, 2007

As revoluções de Julho


Nasser e Che Guevara, líderes do movimento revolucionário dos anos 1950 e 1960

Não foram só os guerrilheiros de Castro Ruz que escolheram uma madrugada de finais de Julho para derrubarem a ditadura de Fulgencio Batista, aproveitando as borracheiras próprias dos festejos do patrono da cidade de Santiago. Numa data em que muitos soldados estavam de folga e neutralizados pelo rum, capturar a guarnição da Moncada, a segunda do país, foi o golpe de mestre que permitiu a Fidel governar com mão férrea os destinos de Cuba e desafiar os Estados Unidos.
Um ano antes, em 23 de Julho de 1952, no Cairo, um grupo de oficiais que tinham sofrido a derrota de 1948 contra os israelitas preparava um golpe militar para derrubar o rei Faruk, considerado responsável pelo insucesso da campanha egípcia contra Israel e pela corrupção do regime. Os jovens companheiros de Gamal Abdel Nasser, saídos da Academia Militar de Abassieh, constituíam o núcleo principal do “Movimento dos Oficiais Livres”, cujo programa assentava em seis pontos: o fim do colonialismo, do feudalismo, da dominação do capital sobre o poder político, o estabelecimento da justiça social, a instauração duma vida democrática estável e a formação de um poderoso exército nacional.
Quando em 23 de Julho de 1952 Nasser e os seus companheiros aproveitam as férias de Verão do rei Faruk, em Alexandria, e fazem o golpe de Estado, a monarquia desmorona-se sem que ninguém a pudesse defender. Eram eles os primeiros egípcios a governarem a sua própria pátria desde os tempos de Cleópatra, a grega ptolemaica. Ao longo de 20 séculos, turcos, mamelucos, franceses e britânicos governaram e sangraram um povo que merecia despertar da sua prolongada letargia.
O medo de não serem suficientemente respeitados, por serem demasiado jovens, levou-os a colocar como figura de proa o general Muhammad Naguib que, não sendo membro dos "Oficiais Livres", foi escolhido por ser o general mais prestigioso e respeitado do país.
Em 26 de Julho de 1956, Gamal Abdel Nasser nacionalizou o Canal do Suez, provocando a ira dos franco-britânicos habituados a considerar o Egipto como o pátio da sua casa. Três meses depois, França e Grã Bretanha intervirão entre israelitas e egípcios, entrincheirados de ambos os lados do canal. A ameaça soviética de desencadear uma guerra nuclear e a ONU puseram fim à contenda. Nasser sobreviveu.

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:: enviado por JAM :: 7/26/2007 11:10:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

segunda-feira, junho 11, 2007

Seis dias e quarenta anos depois

Não foram precisos seis dias para que o exército de Israel derrotasse as tropas árabes nos campos de batalha do Sinai, da Cisjordânia e dos montes Golan. Bastaram poucas horas do amanhecer de 5 de Junho para que os caças-bombardeiros do Tsahal, voando abaixo do raio de acção dos radares, destruíssem 309 aviões da esquadra egípcia, dos seus 340 aparelhos, e depois atacassem os aviões jordanos, sírios e iraquianos que ainda nem sequer tinham descolado das respectivas bases, conseguindo ao segundo dia a completa destruição de 393 aviões árabes.
A “guerra”, recém começada, foi uma derrota humilhante que, durante dias, o presidente Nasser e a propaganda do Cairo tentaram ocultar. Se a guerra de 1948 constituiu o grande desastre dos palestinianos, o Nakba, esta nova guerra dos “seis dias” provocou um profundo sentimento de derrota, traumatizante para os habitantes do Egipto, da Síria, da Jordânia, a derrota dos povos árabes, que se fundiram numa depressão colectiva e numa meditação angustiada sobre as causas do grande fracasso militar.
No quarto dia da guerra, os soldados israelitas esmagaram centenas, milhares, de tanques na península do Sinai, em cujas dunas o pobre exército egípcio fugia à debandada, abandonando até as botas. A conquista das colinas do Golan foi mais encarniçada devido à resistência dos sírios entrincheirados e às baixas israelitas consideráveis. A queda da velha cidade fortificada de Jerusalém converteu-se numa grande vitória religiosa e histórica do povo judeu.
Seis dias e quarenta anos depois dessas batalhas perdidas, mais pela negligência, pela falta de coordenação e pela pouca capacidade de manobra dos altos comandos árabes — o marechal Amer, companheiro fiel de Nasser, suicidou-se após a derrota — do que pela eficiência ou a agilidade dos chefes militares israelitas, as consequências continuam muito vivas. O Egipto recuperou a península do Sinai, a Síria não conseguiu a devolução dos Golan e a Jordânia teve que renunciar às suas jóias da coroa, Jerusalém e toda a Cisjordânia, na qual a maltratada “Autoridade” Nacional Palestiniana tem tentado estabelecer uma diminuta e trociscada entidade estatal.
A paz de Israel com o Egipto e com a Jordânia é uma paz fria. A famosa resolução 242 do Conselho de Segurança da ONU, adoptada em 22 de Novembro de 1967, fundada no intercâmbio dos territórios ocupados, continua por aplicar. Os palestinianos continuam a combater e a exigir agonicamente as suas terras. O conflito palestiniano é, como tantas vezes se repete, o coração dos pavorosos problemas que se vão agravando e acumulando sobre os povos do Médio Oriente.
A grande maioria dos dirigentes árabes já se esqueceu de uma outra resolução que fez elaborar pouco depois daquela guerra, na cimeira de Cartum, que se vangloriava dos seus três “Nãos”: não às negociações, não ao reconhecimento, não à paz com Israel. Voltaram, depois das derrotas humilhantes, depois de meio século transcorrido, à aspiração de dividir a Palestina em dois Estados, um judeu e outro árabe. Mas mesmo este não deixa de ser um sonho difícil de realizar.
Sobre o cemitério das utopias e dos ideais mortos — como o panarabismo, o “novo homem árabe”, a “revolução palestiniana”, os projectos de modernização popular inspirados em modelos progressistas, laicos e europeus — brotaram poderosos e inquietantes movimentos surgidos da interpretação de um Islão totalitário e beligerante, atiçados por ideologias e comportamentos políticos extremistas de governantes dos Estados Unidos e doutras nações do Ocidente.
O final da guerra-fria entre os Estados Unidos e a União Soviética não apagou o fogo do Médio Oriente. O Estado de Israel continua a consolidar-se à custa da guerra, da destruição, da violência, da frustração, do empobrecimento ameaçador dos povos vizinhos, quer eles sejam palestinianos, libaneses ou iraquianos. Seis dias e quarenta anos depois de ter sido configurado o actual mapa regional, os países do Médio Oriente foram arrojados para uma vida quotidiana arrepiante. Seis dias e quarenta anos depois, já ninguém acredita que o mundo é inocente.

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:: enviado por JAM :: 6/11/2007 12:01:00 da manhã :: 1 comentário(s) início ::

quinta-feira, maio 03, 2007

Era uma vez um debate presidencial

Nas sete eleições presidenciais celebradas em França desde que o presidente é eleito por sufrágio universal, só houve quatro debates televisivos. Nas primeiras (1965) a História perdeu aquele que teria sido sem dúvida um combate singular entre o velho general De Gaulle e o ainda jovem Miterrand. Nessa altura, a V República estava em fase de construção e a democracia mediática não fazia ainda parte do mercado político. Quase 40 anos depois (2002), já em plena era da comunicação, Chirac recusou-se a enfrentar Le Pen, frente às câmaras, por medo que, “face à eloquência do candidato da extrema direita, a sua desvantagem oral se transformasse em desvantagem política”. Na altura, foi mais ou menos essa a análise de Michelle Cotta, ex-directora de informação da TF1, que viveu a rude desforra de Mitterrand sobre Giscard, em 1981, e a disputa quase física de 1988 entre o presidente socialista e o seu, até então, primeiro ministro, Chirac.

Antes do debate de ontem, o último tinha acontecido em 1995, entre o noviço Jospin e o já garantido vencedor Chirac. Compreende-se pois que, após uma abstinência de doze anos, os franceses se tivessem precipitado ontem sobre os televisores para assistirem ao combate mais singular da V República: um homem e uma mulher, um bonapartista e uma girondina, um advogado brilhante e uma enarca de carisma atípico, a eloquência devastadora do presidente da UMP e a elocução lenta de Royal. Só as regras do jogo não mudaram desde os primeiros debates de há 30 anos: nada de planos sobre aquele que escuta; a escolha dos jornalistas moderadores; a posição das câmaras e dos microfones; o tamanho da mesa; a distância entre os candidatos...
Em França, como se sabe, quase tudo subsiste desde a tomada da Bastilha e a sagração de Napoleão. Desta vez porém, o factor mulher pulverizou todas as referências e apareceu como uma variável iconoclasta do choque pela presidência de uma república que é simbolizada por uma mulher (Marianne) mas que foi desde sempre dirigida por grandes homens. Mesmo quando eram de pequena estatura como foi Bonaparte, a que agora aspira ser o também pequeno Sarkozy.

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:: enviado por JAM :: 5/03/2007 11:59:00 da tarde :: 0 comentário(s) início ::

segunda-feira, março 26, 2007

Salazar


© desenho de Bandeira

O mal-estar em relação a tudo isto não é culpa da RTP, mas sim de um regime democrático que nunca conseguiu criar uma grelha de valores sólidos e consensuais, nomeadamente quanto ao sentido da democracia e quanto à questão nacional. A história épica ensinada pela ditadura continua a ser o molde através do qual muitos portugueses olham para o passado. A democracia não fez melhor do que reinventar os Descobrimentos como base do espírito nacional. E, sobre temas tão complexos como a Guerra Colonial, preferiu manter o silêncio.

Salazar está bem menos vivo do que se pensa. Para as pessoas que nasceram nos anos 1970 ou 1980, nem pertence ao passado imediato. A pouco e pouco, o ditador deixa de existir na memória de pessoas concretas e torna-se um nome abstracto, impresso entre duas datas nos livros de História. Isto vale tanto para os saudosistas do fascismo como para os discursos construídos em torno da memória do combate à ditadura.

O problema é que, desaparecendo esta memória da história recente, fica apenas um vazio. E o drama do nosso tempo é precisamente esse: o de ter perdido o sentido da história. E, sem esse sentido, o passado torna-se um jogo em que Cunhal, Camões, Salazar ou D. João II valem o mesmo. A História tornou-se num mero concurso de televisão. E isso preocupa.

[Miguel Gaspar, DN/ 27.02.07]

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:: enviado por JAM :: 3/26/2007 05:36:00 da tarde :: 1 comentário(s) início ::

quinta-feira, março 15, 2007

O livro único de História europeia

O livro único de História europeia insere-se nesta tradição infeliz e reflecte a tensão no continente entre a manutenção das unidades políticas que tão penosamente adquiriram a sua existência e essa ideia (que vem ganhando um crescente número de partidários) segundo a qual elas deveriam integrar-se numa única grande entidade europeia. Só que esta ideia, na qual se inclui evidentemente também a da tão decantada "Constituição", contradiz completamente as razões do êxito da integração da Europa. A Europa viveu em paz nestes últimos 50 anos precisamente porque os mecanismos da sua integração evitaram mais um movimento de reconfiguração territorial. Pelo contrário, usaram-se as melhores energias das nações existentes para construir um objecto político sui generis, que não é nem a sua reunião sob a forma federal nem a sua existência estritamente separada. O federalismo europeu devolve-nos às piores razões dos brutais conflitos europeus. A União Europeia que existe, descentralizada, casuística, sem uniformidade, é um grande êxito político e económico, tendo trazido paz e prosperidade. A ideia federal é o contrário disso. É e será sempre fonte de conflitos graves. Não vale a pena estragar o que está bem.

[Luciano Amaral, DN/15.03.07]

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:: enviado por JAM :: 3/15/2007 11:59:00 da manhã :: 0 comentário(s) início ::