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terça-feira, novembro 15, 2005

Em França, é o Estado que arde

Os analistas franceses de todos os quadrantes políticos foram unânimes, nas últimas duas semanas, em considerar aquilo que só o Blasfémias não vê : que a guerrilha urbana lançada pelos “jovens das periferias” não é mais do que um testemunho da total separação entre a sociedade francesa e a sua classe política. O próprio presidente Chirac reconheceu-o ontem na sua comunicação ao país.
O Estado francês tem manifestado, nos últimos trinta anos, um notável autismo, que afecta do mesmo modo todos os partidos políticos, cujos quadros são recrutados nas grandes escolas parisienses. Na concepção Estadocrática francesa, nada muda e nada mudará, porque a França é perfeita como está e como sempre foi. A concepção de Estado actual e a maneira de o gerir são as mesmas que foram instauradas no século XIII: o Estado em cima e a sociedade em baixo; o Estado fixa o rumo e a sociedade vai atrás. A sociedade que é composta por indivíduos iguais, por definição.
Desde os anos 80, o Estado fala, fala,... e a sociedade destroça em todas as direcções. Não existe qualquer relação entre a economia real, capitalista e globalizada, e a política económica dos subsídios aos agricultores que entretanto desapareceram. Não existe qualquer relação entre, por um lado, o discurso do Estado republicano sobre a cidadania e a laicidade e, por outro lado, a Constituição que consagra as comunidades étnicas e religiosas. Não existe qualquer relação entre o discurso do Estado sobre a imigração e os imigrantes que chegaram aos montes para usufruir das excelentes escolas e dos óptimos hospitais.
Na França de hoje, o patronato internacionalizou-se, os estudantes desligaram-se da política, os sindicatos, em vez de defenderem os trabalhadores, defendem os seus interesses particulares, os partidos perderam os militantes, os imigrantes criaram uma economia paralela. Todas essas micro-sociedades vivem em França mas deixaram de constituir uma República francesa. O Estado francês mete o nariz em tudo, mas tornou-se, na prática, completamente ineficaz. Está presente onde a sociedade não precisa dele, mas está ausente onde é mais necessário. Há dois anos, deixou morrer trinta mil idosos desidratados. Agora é incapaz de resistir a algumas dezenas de batalhões de meliantes.
E quem foi que criou as zonas de não-direito onde irromperam os incêndios? Foram os adolescentes, ou foi o Estado autista?

:: enviado por JAM :: 11/15/2005 11:57:00 da tarde :: início ::
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