quinta-feira, março 20, 2008
Olhar com olhos de ver
:: enviado por RC :: 3/20/2008 03:51:00 da tarde :: início ::
1 comentário(s):
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Manuel:De , em março 29, 2008 10:41 da manhã
Olhos com Olhos de Ver II
Obviamente, ainda não tive tempo de ler esta entrevista ( a Mário Nogueira), o que vou
fazer com cuidado e respeito. Mas não hoje, pois só acabei de chegar a
casa há meia hora (eram 21 horas).
A minha posição neste momento e perante todos os problemas que têm
assolado a classe - se não se reconhecia até agora como tal, passou
reconhecer-se, depois de 100 mil se terem unido numa muito
representativa manifestação - é que tudo que está a contecer tem como
raíz este Ministério de Educação e os anteriores. E nunca essa raíz
terá de ser procurada nas escolas ou nos profissionais. Ao abater-se
sobre os professores, esta tutela criou o erro mais crasso de todos,
pois escamoteou aquela evidência, querendo tapar os olhos à população
pouco esclarecida, mas que agora se acha no direito de falar do que
não sabe, no meio da confusão gerada. Confusão e ainda histeria, essa
também lançada pelos responsaveis ministeriais, num caos que não pode
ser pior.
Com efeito, têm-se sucedido experiências ao longo dos anos num
ministério governado, em geral, por incompetentes e por pessoas que
pouco sabem de educação e do que é uma escola. Os elementos que
preenchem estes lugares de suma importância são, normalmente, gente
oriunda dos partidos ou dos lobbies dos partidos. Muitos deles nunca
pisaram os corredores duma escola e têm, bem no fundo, uma certa
indiferença ( para não chamar desprezo) por ela. Os que,
eventualmente, poderão ter demosntrado alguma ligação à educação são
personagens que andaram anos e anos a martelar em discursos de
"eduquês", nas suas vertentes todas e num reducionismo do saber, da
autoridade, da interpessoalidade crescida e saudável, da segurança,
que são inerentes à educação na sua maior abrangência. Haverá excepções, acrescento, mas no meio da cadeia de erros em que entraram, pouco puderam fazer.
Se juntarmos a estes ingredientes, todas as inflexões desestruturadas
do "crescimento" aparente da mentalidade portuguesa e das suas
conjunturas económicas e sociais, assim como da impreparação das
massas, então teremos um quadro bem negro, que é o que se nos
apresenta.
Há, certamente, professores muito bons e outros menos - mas essa não
é a questão, nem são os professores que têm de ser avaliados, mas sim
essa procissão de ministros e secretários de estado desde Veiga Simão,
incluído este, como bem nos lembra Vasco Pulido Valente, numa das suas
crónicas.
A Sr.ª Ministra, mulher que pouco sabia de educação, ou que nada sabia
- agora deve saber um pouco mais - faz o que o Sr. Sócrates a manda
fazer, ainda por cima com arrogância, teimosia,antipatia e, claro,
vontade de poder. E tais ordens nada têm a ver com a qualidade
propalada por aquela e pelos seus assessores. Pelo contrário.
Como formadora de formadores, assisto, muito perturbada, à demagogia
dos discursos destes(i)responsáveis e aos erros sucessivos desta
tutela.
A questão do concurso de titulares foi a primeira coisa que me
azamboou. Pois tratou-se de um concurso inenarrável, viciado desde o
início. Nos campos de preenchimento dos boletins - eu preenchi, sei e
fiquei (neste momento sou titular, mas pedi uma licença sem
vencimento de longa duração e estou noutra situação agora,
pois era requisitada e assistente convidada numa universidade e não poderia continuar
desta forma, num processo que constituiu um autêntico "case study" que
um dia lhe posso contar) - nada indiciava qualidade pedagógica, como
se sabe, pois o concurso não se encontrava baseado no verdadeiro
processo estruturante do que é a Essência do ser professor. Pelo
contrário, tal vertente, a maior, encontrava-se sonegada e a favor das
tarefas burocrático-logísticas, de circunstância e acaso, ou
outros...muitas das quais foram preenchidas, anos a fio, pelos menos
preparados em formação inicial superior, quer em matéria técnica, quer
na parte humana. Por outro lado, a disparidade dos pressupostos de
acesso para os professores do 10º escalão e os outros eram manifesta e
injustamente gritante.
Foi assim que vimos entrar para o lugar gente da menos qualificada.
Por exemplo: pessoas que, tendo feito a Profissionalização em Serviço,
se eximiram a efectuar o 2.º ano de formação, o mais importante e que
jamais praticaram a "praxis" em ciclos de supervisão observada. Nem
sabem o que isso é sequer! Assim, como poderão agora arvorar-se em
avaliadores? Só para dar um exemplo...
Por outro lado, esta distinção falsa entre "excelentes"(!) à pressão,
como se fossem vinho duma cooperativa onde nunca entraram uvas e "os
outros", partiu em duas metades uma melancia já de si frágil e pouco
sumarenta na sua unidade e grainhas, por causa dos tais erros em
catadupa que cairam no ensino,muitos, ou quase todos em círculo
vicioso, derivados da massificação e normatização do ensino e
derivados também da mania de tudo querer ser doutor, em parâmetros de
exigência que, nalguns casos do superior, são verdadeiramente
duvidosos, dado que se seguiu na proliferação da oferta formativa e à pressão...
A partir daqui, da lei dos titulares, ou concomitantemente, a tutela
já preparava a continuação desta perversidade - a avaliação de
docentes, uma coisa difícil, complexíssima, vertida em quadros e
tabelas confusos, inexequíveis, raiadores do desespero de qualquer
mente sã e afinada. Tudo o que é obscuro esconde ignorância. O que é
sábio, é simples.
E esta "avaliação", nos seus campos (pois dos pressupostos já nem
falo...) é aberrante. Para mim, como formadora, avalio para formar.
Não supervisiono e avalio com o mero intuito de classificar, de
desmotivar, de desagregar, de desestruturar "selfs" de educadores.
Eu jamais poderia aplicar o modelo proposto.
Não sei de que cabeças peregrinas saiu o modelo, mas de mentes
brilhantes não foi concerteza, mas sim de burocratas, de
quantificadores, de medidores, de comportamentalistas, de gente sem
alma. Porque o modelo desalmado é. E, em docência, tudo tem de ter
alma, chama, dadivosidade, saber, simpatia, bom cheiro, limpidez,
flexibilidade, até sorrisos.
E este modelo cheira mal, fecha os rostos, traz lágrimas a pessoas
que, diz você muito bem, precisavam de um colinho, porque todos
precisamos dele nesta sociedade feroz, cada vez mais abstracta,
competitiva e geradora de infelicidades mil.
Que este modelo tenha sido parido por uma mulher ministra, ainda é
pior. Porque é da matriz ginocrática que nascem as melhores coisas do
mundo: as mais rigorosas e as mais quentes e gratificantes. Uma mulher
que não sabe que isto é assim, cujos côncavos são preenchidos por
números e olhares ferozes a despejar lumes, uma mulher que se atirou
aos que, muitas vezes também são mães e pais, é uma mulher desalmada,
uma ameaça às outras mulheres e aos filhos delas, para já não falar
nos homens, também filhos e pais.
Não há uma escola a que eu vá agora onde não se sinta este ambiente
pesado, de chumbo atirado às salas de professores. Fecham-se os rostos
e anseia-se pela "reforma". Abateu-se a depressão e desligam-se os
motores da criatividade, da projecção positiva e crescente dos
educadores/professores.
E ainda não se abateram sobre os telhados os novos modelos de gestão,
de que já nem vou falar, mas que me fazem lembrar os idos do 24, com
os senhores reitores do regime, afiambrados e prepotentes. Foi contra
eles que lutei também após o 25 e não me obriguem a andar outra vez
com uma bandeira pelas ruas, grávida então estava eu de muitos meses, mas jovem e
cheia de esperança. Agora, no descer da montanha da vida, estou grávida de angústias.
Um abraço, Teresa Soares