segunda-feira, setembro 20, 2004
A lei do véu islâmico
Enquanto os portugueses, uma vez mais, gritam de indignação, encolhem os ombros, ou fazem apostas para saber quando começará finalmente o ano lectivo, com um quorum mínimo de professores e alunos, os franceses assistiram, com a pontualidade habitual, em 2 de setembro, ao regresso às aulas dos cerca de 12 milhões de alunos, matriculados em 60.000 estabelecimentos, do ensino infantil ao secundário.Um regresso calmo, muito embora, o ministro da educação, François Fillon, tenha contado, no primeiro dia de aulas, 240 jovens alunas que se apresentaram com um véu islâmico, das quais apenas 170 aceitaram tirá-lo. As restantes 70 viram-se obrigadas a entrar “em fase de diálogo” com a Educação Nacional, ou seja, foram colocadas em salas de estudo e tiveram que assistir a uma aula especial onde lhes foi explicada a nova legislação. E o ministro concluiu assim : “Isto demonstra que a lei foi aceite”.
A lei, relativa à aplicação do princípio da salvaguarda duma escola pública laica, estipula que é importante fazer respeitar o principio da separação entre a Igreja e o Estado na Educação e que é preciso proteger o Estado laico da ameaça que representa o fundamentalismo religioso e, particularmente, o fundamentalismo islâmico. Os alunos que forem proibidos de assistir às aulas por não respeitarem as novas regras, algo que ocorrerá depois de um diálogo intenso com as famílias, terão como opções a educação à distância ou um centro de ensino privado.
Ora, à luz do direito internacional, os Estados só podem restringir a prática duma religião quando essa prática constitui uma ameaça à segurança pública ou quando as manifestações da fé religiosa se tornam entrave aos direitos fundamentais dos outros. Ou ainda, como no caso da função educativa, quando a ostentação dum sinal de pertença a uma qualquer religião constitua um obstáculo à relação entre professor e aluno.
Os véus muçulmanos, os turbantes sikhs, as kippas judaicas e as grandes cruzes cristãs, que são os sinais ostensivos proibidos por esta lei, não representam nenhuma ameaça à segurança pública ou à moral social. Também não constituem entrave às liberdades e aos direitos fundamentais dos outros alunos. Finalmente, também não consta que possam pôr em causa a função educativa da escola.
A questão do véu islâmico está a ser utilizada, quer por aqueles que pretendem expressar sentimentos anti-imigrantes e anti-muçulmanos, quer por muçulmanos radicais, no mundo inteiro, como o demonstrou a, recente, crise dos jornalistas franceses raptados no Iraque, cuja vida estaria dependente da anulação da lei.
Em vez de proibir pura e simplesmente o porte do véu e dos outros sinais religiosos nas escolas, não seria mais educativo promover a compreensão mútua e a tolerância face aos valores dos outros ?
:: enviado por JAM :: 9/20/2004 11:23:00 da manhã :: início ::