BRITEIROS: Quando os monges fazem a revolução <$BlogRSDUrl$>








terça-feira, setembro 25, 2007

Quando os monges fazem a revolução

No conforto do terror e dos plenos poderes, os ditadores acabam sempre por cometer os mesmos erros. Os generais birmanes resolveram aumentar 66% o preço da gasolina, 100% o do gasóleo e 54% o do gás. Todos os outros preços subiram rapidamente em flecha, sobretudo os dos transportes públicos, num país que é um dos vinte mais pobres do mundo. Para muita gente, ficou mais caro ir para o trabalho do que parar de trabalhar de vez e ficar em casa.
A junta militar achou que o país, habituado à negação de todas as liberdades, baixaria de novo a cabeça, por receio de uma resposta sangrenta das forças armadas. Mas, inesperadamente, o povo saiu para as ruas.
No dia 6 de Setembro, monges budistas de Pakokku tomaram como reféns os milicianos que os maltrataram na altura em que eles pretendiam juntar-se aos manifestantes. Desde a semana passada, é na própria capital do país que dezenas de milhares de monges, descalços e nos seus hábitos cor de canela e açafrão, desfilam pelas ruas. Cada dia mais numerosos, juntando à sua volta cada vez mais gente. “Marchamos pelo povo!”, gritam eles.
Os ditadores da Birmânia não sabem como reagir a esta vaga. Até a China, que é o único país do mundo que os apoia, multiplica os conselhos de moderação aos militares birmaneses. Por receio de uma condenação por parte da Assembleia-geral das Nações Unidas, a junta militar mantém-se singularmente calma. Até quando... não se sabe. Por enquanto, não ousa atacar os monges, mas nada é mais perigoso para uma ditadura do que deixar aparecer a sua fragilidade.
A liberdade e a democracia poderão marcar alguns pontos neste braço de ferro e a China poderá perder um dos peões do seu dispositivo asiático. Para eles, a Birmânia é, por um lado, um bom fornecedor de matérias-primas e, por outro lado, uma excelente barreira contra a Índia limítrofe. Se os generais caíssem, isso seria uma ameaça para a unidade do país que só a ditadura tem conseguido manter.
Percebe-se agora melhor porque é que o PCP de Jerónimo de Sousa não gosta do Dalai Lama nem de monges revolucionários.

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:: enviado por JAM :: 9/25/2007 10:20:00 da manhã :: início ::
7 comentário(s):
  • Eu não tenho nada a ver com o PCP nem com o Jeronimo (nem quero ter) e também não gosto do Dalai Lama nem de monges revolucionários ou não.

    De Anonymous Anónimo, em setembro 25, 2007 12:41 da tarde  
  • Caro Joca:

    Que fique claro que eu em geral também não tenho especial predilecção por monges. Só que, no contexto de um país como a Birmânia, a que outra coisa mais sublime que ser monge podem aspirar os jovens? Aí, tal como acontecia na Idade Média, ser monge é a única forma de aceder à cultura e ao conhecimento e ganhar (alguma) independência em relação ao poder. E que estatuto, mais do que o de uma carmelita descalça, coube à principal opositora ao actual regime birmanês, Aung San Suu Kyi, em prisão domiciliária? Com a falta de apoios internacionais, em grande parte por causa da pesada pata da China, com quem mais poderá ela contar a não ser com os monges?

    Já dizia André Malraux, quando questionava se o século XXI iria ou não ser “um século religioso”. A resposta que encontrou foi: “Ou será religioso, ou não será”... Mas isso, não será por culpa dos monges, mas sim devido à ausência de ideologias.

    De Blogger JAM, em setembro 25, 2007 1:23 da tarde  
  • «O Dalai Lama foi recebido na qualidade de entidade religiosa e, enquanto tal, nós decidimos participar», afirmou Jorge Machado em declarações aos jornalistas no final da audiência, acrescentando que o «PCP respeita os líderes religiosos».

    «Se viesse outro líder religioso, faríamos a mesma ponderação«

    Isto foi o que saiu nos media (Diário Digital, neste caso) em relação à participação do deputado do PCP na reunião da comissão dos Negócios Estrangeiros na AR com o Dalai. Parece-me pois que essa referência ao Jerónimo deste post está um tanto ou quanto metida a martelo...não estará?

    De Anonymous Anónimo, em setembro 25, 2007 10:07 da tarde  
  • “Jerónimo de Sousa acrescentou que nada ter contra o Dalai Lama a titulo pessoal mas defendeu que o primeiro-ministro, José Sócrates, deve respeitar e ter em conta as relações diplomáticas que o país mantém, referindo-se à China”.

    Jornal Público, 13.09.2007

    A mim não me parece assim tão deslocado referir Jerónimo de Sousa no contexto birmanês. Qualquer vénia feita ao sistema imperialista chinês equivale a aceitar os regimes monstruosos que eles alimentam pelo mundo, por puras razões geoestratégicas e económicas: a Birmânia, o Sudão, ...

    Não se pode defender as FARC contra Uribe e os Estados Unidos e depois ficar-se calado perante a ditadura birmanesa e os massacres do Darfur, só para não ter que condenar o papel da China.

    De Anonymous Anónimo, em setembro 26, 2007 8:49 da manhã  
  • Sou das que defendem que não traz qualquer ganho para os povos do mundo, para a paz e para a cooperação entre os povos a política de contenção da China, nas suas múltiplas cambiantes, da venda de armas a Taiwan pelos EUA à manipulação das preocupações ambientais. Porque se o mercado da China oferece hoje mais-valias irrecusáveis ao grande capital, a verdade é que a afirmação da China soberana e do seu papel no mundo assustam muito.

    Bush é responsável pelo assassínio de mais de 600.000 civis no Iraque, autorizou a tortura de prisioneiros na base naval de Guantánamo e o sequestro de pessoas, voos clandestinos e prisões secretas. Não tem pois nenhuma autoridade moral para apregoar direitos humanos na Birmânia. Apenas o fez por puro oportunismo político.

    Por aqui se vê como a agenda de certos monges, dalais, bispos e outros nobelizados coincidem na instrumentalização dos direitos humanos para conter não apenas a China, mas também a Índia. E como são coincidentes com a agenda de alguns jorges.

    De Anonymous Anónimo, em setembro 26, 2007 2:15 da tarde  
  • Excelente conclusão Margarida. Não vale a pena dizer mais nada:
    Enquanto os carrascos da junta militar não chegarem aos 600.000 mortos, monges ou não, o regime chinês pode continuar a apoiar os seus amigos do governo socialista de Myanmar, porque ao fazê-lo não deixam de ser mais bonzinhos do que o filho da puta do George Bush.
    Está certo. Vivemos num mundo de filhos da puta relativos.

    De Anonymous Anónimo, em setembro 26, 2007 7:13 da tarde  
  • Essa do “governo socialista de Myanmar” é a primeira vez que oiço, você lá sabe quem lha bichanou. E quanto aos mortos a que alude faz-me lembrar as profissionais do histerismo – ainda ontem ouvi a Jane Birkin com as mesmíssimas previsões, como antes a ouvira sobre o Afeganistão, Iraque, Jugoslávia -, mais velha, gasta e desgastada mas sempre igual. E hoje ia ser recebida pelo Sarkozy integrada numa delegação da oposição de Myanmar. Antes, fora recebida pelo Jospin, Mitterrand, pelo menos que me lembro, sempre lacrimosa, sempre com os direitos humanos na boca. Deve entretanto ter-se esquecido dos mais de 2,5 milhões de refugiados e mais de 2 milhões de deslocados apenas no Iraque. E dos records de produção de droga no Afeganistão. E dos mortes, deslocados e ódios semeados na ex-Jugoslávia.

    Mais velhos, mais cínicos, menos credíveis e mais patéticos ainda mexem contudo, os filhotes do Bernard Kouchner, o tal das intervenções e das ingerências, o tal da sociedade civil, das ONG's e media que ninguém elegeu. O tal que escreveu:
    “Ei-la, a ideia revolucionária: que os direitos do homem, e não mais os Estados, rejam o mundo. Certo, todos os Estados assinaram a declaração universal dos Direitos do Homem, todos os Estados são presumidos de terem renunciado à tortura e à opressão das minorias, e sabemos bem que a metade deles, talvez ainda mais, não respeitam este paragrafo solene.
    Para os constranger pouco a pouco, é preciso uma intervenção da comunidade internacional, uma repressão eventual, o instrumento é o direito de ingerência. Isso exige um tipo de tribunal por cima dos Estados, que só pode sair da ONU e que só se pode fazer respeitar pelo constrangimento, por vezes mesmo pela força armada.” (Dieu e les hommes, página 119).
    Mas que nem isso o Kouchner pratica, como se vê pelo belicismo contra o Irão, onde já nem lhe chegam as sanções decretadas pela ONU, quer mais, quer que a UE decrete outras mais. Eu não consigo deixar de me assustar ao pensar que teríamos por cá o Belmiro, o Joaquim de Oliveira, o Balsemão, e o Zé Falcão a impor-nos constrangimentos à revelia de governos e de organizações internacionais legalmente constituídas. É por este paradigma que alguns pugnam. Pôr patrões e amigalhaços a mandar em todos nós. Não faltava mais nada.

    De Anonymous Anónimo, em setembro 26, 2007 8:44 da tarde  
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