sexta-feira, novembro 17, 2006
Milton Friedman
Faleceu ontem, aos 94 anos, Milton Friedman, prémio Nobel da economia, pai da Escola de Chicago, papa do liberalismo, um homem que marcou a nossa época pelo monetarismo e pela desregulação, tal como Keynes tinha marcado o período entre as duas guerras, ao inspirar o new-deal, a social-democracia e o Estado providência, a protecção social em suma.Para ele, o inimigo era o Estado, o imposto que mataria o imposto, por travar o crescimento, e sobretudo pelas ajudas sociais que instalariam os pobres na pobreza, privando-os, dizia ele, da incitação a saírem dela.
Totalmente convencido da justeza das suas teorias, Friedman tinha resposta para tudo e quando, em Julho passado, um jornalista lhe perguntava: Mas, veja bem, eu, como europeu, estou contente por ter uma segurança social, uma reforma garantida, escolas para os meus filhos,... Ao que Milton Friedman retorquira, com a mesma frontalidade e com toda a seriedade: é porque você não sabe até que ponto estaria muito mais contente sem isso tudo. E o jornalista balbuciara: mas... isso é absurdo... impensável... Porém, Friedman, sem desarmar, insistira categoricamente, explicando que a escola pública, gerida e financiada pelo Estado, acabava fatalmente por se transformar numa escola feita para os professores e não para os alunos (onde é que já ouvimos isto?), porque um bom sistema de ensino só pode ser garantido pela concorrência e porque cabe a cada um de nós assegurar a sua própria reforma e a sua própria cobertura médico-social, em plena responsabilidade de indivíduos livres...
Era extremamente difícil discutir com esse homem imperioso que foi conselheiro e inspirador de Ronald Reagan e de Margaret Thatcher e, ao mesmo tempo, era um verdadeiro desafio ouvi-lo, para tentar compreender a lógica dos seus argumentos. Mas como é que as suas ideias ― o liberalismo, a ideia de que o mercado pode e deve regular tudo sozinho ― se conseguiram impor, de uma maneira tão universal, no mundo inteiro?
A resposta é que as classes médias ocidentais, depois de se terem convencido da eficácia dos impostos e da redistribuição social, entraram em revolta, nos anos 70, contra a pressão fiscal, até conseguirem fazê-la resvalar para a direita, abandonar a esquerda, e isso ― numa altura em que se assistia simultaneamente ao aumento da esperança de vida, aos progressos da medicina e à concorrência dos países emergentes ― destruiu os fundamentos do Estado providência, minando todos os seus sistemas de protecção. Foi a conjunção dessas duas realidades que puseram na moda as ideias neoliberais, fazendo-as passar por revolucionárias.
Milton Friedman morreu, mas, enquanto as ideias de solidariedade social e de Estado árbitro não forem capazes de responder a esses desafios, enquanto a ideia de progresso não for capaz de se reinventar, o liberalismo terá dias radiosos pela frente.
:: enviado por JAM :: 11/17/2006 03:00:00 da tarde :: início ::
1 comentário(s):
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Excelente, como sempre.De , em novembro 17, 2006 5:00 da tarde